quarta-feira, 20 de junho de 2018

Num Labirinto de Olhares Profundos

SANCTUARY
Criação de Brett Bailey
Co-produção Third World Bunfight e Maria Matos Teatro Municipal
Local: Estúdio 1 da Tobis, Lumiar 
Data: 19 de Junho, 20 horas

"Sanctuary" é uma curta viagem da qual não se sai com a respiração com que se entrou. Um labirinto opressivo, ladeado por grades e arame farpado, sujeitos a avisos - letras brancas e fundo azul, é a União Europeia a falar connosco. Um labirinto para estes novos Minotauros. A Europa é, hoje, e para os que a desejam alcançar, um espaço de "limbo" (é o próprio Brett Bailey quem o sugere) e é para esse limbo que somos atirados enquanto espectadores.
O confronto é olhos nos olhos com pessoas e as histórias delas que lemos, de cabeça baixa, enquanto somos observados o tempo inteiro. Desta vez, somos nós o foco da atenção, não eles. Os performers fixam-nos o tempo todo, até ao momento em que é difícil suportar o olhar. Enquanto nos ocupamos com outras coisas, a leitura de mensagens dispostas em ecrãs, eles continuam lá, a olhar-nos. No final, chega a ser incómodo virar as costas. Mas viramos as costas e seguimos. A instalação força o espectador a virar as costas ao problema. Que grandioso paralelismo!
As histórias de vida mas também a violência sexual, o lixo, a sujidade, o arame farpado, as roupas abandonadas ou perdidas, os coletes cor de laranja, as grades, os avisos de segurança e de proibição, o som das ondas do mar; está lá tudo.

Depois, o populismo, a xenofobia e o medo. Cruzamo-nos com o irracional antes de voltar à realidade (?)... antes de voltar à (nossa) outra realidade. A verdade dos que recusam mais pessoas dentro de umas fronteiras também existe, também está presente, também verte os seu olhar sobre nós.

A instalação do sul africano Brett Bailey coloca o espectador num ponto de alta sensibilidade. Atira-o para uma zona desconfortável, de barreiras, má iluminação, muitas ordens e muito desconhecido; depois, confronta-o com o silêncio dos outros; e ainda faz dele objecto de atenção. O performer é também um espectador do espectador. Este é o único que faz coisas, nomeadamente observa e lê. Os performers observam-no a fazer isso. É uma inversão violenta que deixa cada elemento do público (e cada elemento anda sozinho pelo espaço) ao sabor da descoberta.



Lisboa: Estúdio 1 da Tobis, no Lumiar, até 24 de Junho
Porto: Palácio dos Correios (Gabinete do Munícipe da Câmara Municipal) - 3º piso, de 2 a 6 de Julho

sexta-feira, 15 de junho de 2018

Irving: de bobo a promotor de uma lady

Henry Irving (1838-1905) foi um actor britânico, durante a transição do século XIX para o século XX. Foi o primeiro actor a receber o título de Cavaleiro, em Inglaterra. Isso aconteceu em 1895.
Anos antes, estando a sua mulher, Florence, grávida do segundo filho, durante um passeio de carruagem, ela perguntou-lhe se ele pretendia continuar a ter essa profissão de palhaço para o resto da vida. Ele saiu da carruagem e nunca mais a viu.
No entanto, os dois não se divorciaram formalmente. Em 1895, quando Irving foi nomeado Cavaleiro, Florence passou a chamar-se a si própria de "Lady Florence".


terça-feira, 1 de maio de 2018

O Estagiário


(texto do programa Panela de Pressão de 1 de Maio, na RDS Rádio)

Atenção! Atenção!

Hoje é dia. Hoje é dia especial. Rádio. Atenção. Rádio, animação. Atenção! Novidades. Hoje. Dia especial. Hoje.
Vou anunciar.

Este programa vai ser, nos próximos tempos, digo meses; nos próximos tempos; vai ser assegurado por um ESTAGIÁRIO.

(Música. Blaya – Faz Gostoso)

Atenção! Ordem! Atenção!

Um estagiário é um estagiário, não é um animal. Um estagiário é um animal mas com dignidade. Um animal também tem dignidade. Um animal tem muita dignidade. Um animal tem mais dignidade do que um estagiário.

Vamos ver! Vamos ver!

Estamos a chegar ao Verão, pelo que... Estamos quase a chegar ao Verão... Já é Maio... Ainda só é Maio... Já é Maio... É quase Verão. Estamos a chegar ao Verão. Toda a gente precisa de férias. No Verão. Toda a gente precisa de férias. Toda a gente precisa de estagiários. Não comem, não bebem, não falam. Podem falar. Na rádio é útil que falem. Mas não comem nem bebem. E gostam. Não recebem salário e trabalham... Se vocês vissem um estagiário a trabalhar!... Isso é que eles são!... Até nos dá vontade de começar a trabalhar também.

Mas não. É quase Verão. Precisamos de férias. Toda a gente precisa de férias. O estagiário fica. E faz. Fica e faz. O que for preciso ele faz. Ele faz o que for preciso.

E não discute. Não reclama. É estagiário. Que importa! Desde que faça. Que importa? Pode vir da Universidade Católica. O papá paga. Ou pode vir de uma faculdade pública. São mais mal vestidinhos mas também não reclamam e são mexidos. O pai paga. Em qualquer dos casos. Esperemos que o pai pague. Senão, só em sandes é um balúrdio. Se o rapaz vier para aqui com fome. Ou a rapariga. Com fome. Também pode ser uma rapariga. Desde que consiga fazer os mesmos graves que eu. Uma rapariga boa que faça graves. Digo, uma rapariga que faça bons graves. Uma boa rapariga boa a fazer graves. Bons graves.

Os ouvintes estão habituados a ter bons graves. Os ouvintes querem continuar a ter bons graves. A ter graves, digo. Os ouvintes, por norma, são graves. E desde que a emissão não pare que importa que se seja um estagiário? Que importa que seja? Não pensamos muito nisso. Os ouvintes não pensam muito nisso. Que importa? Quem seja? Não importa.

Que não coma, não beba, não receba salário. Não importa. O pai paga.

E todos precisamos de férias. É Verão. É quase Verão. Todos precisamos de férias. Todos precisamos de um estagiário.


sexta-feira, 6 de abril de 2018

Porque vamos estar na rua?

Os artistas vão estar na rua hoje, em Lisboa, no Porto, em Coimbra, Beja, Ponta Delgada e Funchal. Na última semana, os profissionais (de profissões não regulamentadas) moveram-se, protestaram, discutiram e fizeram o Governo e o Primeiro-Ministro parar para pensar. Ele pensou e tem vindo a atirar com dinheiro para cima. Aumentou a dotação orçamental, mais companhias vão ser apoiadas. Está bem.

Maiores do que os motivos que fizeram rebentar a contestação são os motivos que a devem sustentar. Termos de estar continuamente a explicar a importância da Cultura para um país é um exercício interessante mas torna-se cansativo. Preferíamos que se percebesse à primeira.

É por isso que vamos estar na rua. Para explicar, mais uma vez.

Pedir um por cento para a Cultura é apenas pedir um número - eles percebem melhor quando se fala em números.

É por isso que vamos estar na rua. Os bancos têm pedido números muito mais pesados e recebem logo. Vamos ver se resulta connsoco também.

Temos uma profissão, ela deve estar regulamentada e encarada como tal. O teatro, a dança, a luminotecnia, por exemplo, não são hobbies. Compreenderão que passar dias dentro de uma sala de ensaios seja muito fraca escolha como hobby.

É por isso que vamos estar na rua. Para dizer que profissões que pagam impostos (mais impostos do que outras até) podem e devem ser regulamentadas.

Acima de tudo, que se entenda a Cultura como início e fim de uma democracia.

É por isso que vamos estar na rua. Por uma democracia culta e informada.

(Carlos Alves)



terça-feira, 27 de março de 2018

Mensagem do Dia Mundial do Teatro 2018

Por Sabina Berman (México)
Tradução de Renato Alves
Divulgada pelo Instituto de Teatro Internacional

Podemos imaginar.
A tribo caça pássaros lançando pequenas pedras no ar, quando um gigantesco mamute surge na cena e RUGE - e, ao mesmo tempo um pequeno humano RUGE como o mamute. Logo, todos fogem...
Esse rugido de mamute proferido por uma mulher humana - quero imaginá-la mulher - é a origem do que nos torna a espécie que somos. Uma espécie capaz de imitar o que não somos. Uma espécie capaz de representar o Outro.
Saltemos dez anos, ou cem, ou mil. A tribo aprendeu a imitar outros seres e representa no fundo da caverna, na luz trêmula de uma fogueira, quatro homens são o mamute, três mulheres são o rio, homens e mulheres são pássaros, chimpanzés, árvores e nuvens: a tribo representa a caçada da manhã, capturando o passado com seu dom para o teatro. Mais surpreendente: assim a tribo inventa possíveis futuros, ensaiando possíveis maneiras de vencer o inimigo da tribo, o mamute.
Rugidos, assobios, murmúrios - a onomatopéia desse primeiro teatro - se tornarão linguagem verbal. A linguagem falada se tornará linguagem escrita. Seguindo esse caminho, o teatro se tornará rito e, logo mais, cinema. E na semente de cada uma destas formas, continuará presente o teatro. A forma mais simples de representação. A única forma viva de representação. O teatro, que quanto mais simples é, mais intimamente nos conecta com a mais maravilhosa habilidade humana, a de representar o Outro.
Hoje, em todos os teatros do mundo, celebramos essa gloriosa habilidade humana de fazer teatro. De representar e assim, capturar nosso passado para entende-lo – ou de inventar possíveis futuros, que podem trazer mais liberdade e felicidade à tribo.

Eu falo, claro, das peças que realmente importam e transcendem o entretenimento. As peças
que importam, hoje são propostas da mesma forma que as mais antigas: derrotar os inimigos contemporâneos da felicidade da tribo, graças à capacidade de representar. 
Quais são os mamutes a serem vencidos hoje no teatro da tribo humana?
Eu digo que o maior mamute de todos é a alienação dos corações humanos. A perda da nossa capacidade de sentir com os Outros: sentir compaixão. E nossa incapacidade de com o Outro não-humano: a Natureza.
Que paradoxo. Hoje, nas margens finais do Humanismo – da era do Antropoceno - da era em que os seres humanos são a força natural que mais se transformou e mais transformou o planeta - a missão do teatro é inversa à que reuniu a tribo originalmente para fazer o teatro no fundo da caverna: hoje, devemos resgatar nossa conexão com o mundo natural.
Mais do que a literatura, mais do que o cinema, o teatro - que exige a presença de seres humanos diante de outros seres humanos - é maravilhosamente adequado à tarefa de nos salvar de nos tornarmos algoritmos. Abstrações puras.
Deixe-nos remover do teatro tudo o que é supérfluo. Deixe-nos desnudá-lo. Porque quanto mais simples é o teatro, mais fácil é lembrar-nos do único fato inegável: nós somos, enquanto estamos no tempo; que somos enquanto somos carne e osso e corações batendo em nosso peito; que somos o aqui e agora, apenas.
Viva o teatro. A arte mais antiga. A arte mais presente. A arte mais maravilhosa. Viva o teatro.

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*sublinhado meu

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

E Se Fosse Com o António Calvário?


Estou muito aliviado hoje porque já sei que não fui escolhido para apresentar o Festival da Canção. É menos um problema.

Serve este prelúdio presunçoso e patético para avançar na abordagem à escolha das quatro apresentadoras quatro que vão lidar a corrida na Arena da Altice, na próxima edição do Festival da Eurovisão. Culpa de Salvador Sobral, o Festival, neste ano, realiza-se em Lisboa, o que representa enorme regozijo entre todos os nacionais vivos. Lembremos que há dois anos ninguém levantaria os olhos dos classificados do Correio da Manhã para perder tempo a olhar para o Festival da Canção. Tempos houve em que este era um evento que, quando muito, se via de costas. As coisas mudaram, a música agora é outra e o Festival é prestígio.

O alarido foi grande aquando a revelação das escolhidas apresentadoras que espalharão charme e sorrisos por essa Europa fora, em Maio. Catarina Furtado, um clássico; Sílvia Alberto, a réplica do clássico; Filomena Cautela, algo demasiado acelerado para ser classificado por ora; e Daniela Ruah, a representante portuguesa de Hollywood na Europa, para espetar na cara do resto do continente.

As primeiras vozes críticas surgiram de imediato em torno do género das escolhidas. “Então, mas é só mulheres”? Argumento facilmente rebatido por dar-se o caso de que, até ver o trabalho dessas quatro mulheres, não estou certo de que alguém o faria melhor só por ter um pénis. Questão respondida, podemos avançar.

Engraçou-me o impacto da escolha das apresentadoras do evento, o qual antes qualquer um atiraria, sem qualquer pena, para as mãos do Eládio Clímaco. “O Eládio faz, ele também já está habituado aos Jogos Sem Fronteiras...”

Agora não. Desta vez, procurou-se uma frente nacional de beleza feminina, sorrisos bonitos e corpos para vestidos de estilista famoso. Foi preciso um tipo desconchavado com um casaco dois tamanhos acima para entregar glamour à Eurovisão. O assunto de que nem se queria falar, virou trend do dia. Um Festival que antes era seria visto como coisa para despachar para o José Figueiras, agora até a Cristina Ferreira apresentaria de bom grado. Um evento que carregava o peso de ser bimbo, agora é discutido no twitter. Onde não há pessoas bimbas, só intelectuais cosmopolitas. A dizer barbaridades a toda a hora mas são barbaridades intelectuais e cosmopolitas.

Quem diria que ainda um dia haveríamos de ver a Eurovisão ser tão relevante para para Portugal! Note-se que a primeira vez que lá fomos foi com uma canção chamada “Oração”, cantada por António Calvário, muito bem executada, não se duvida, mas que era a depressão em forma de notas musicais. Era como se tivessem cortado o Salazar em pedacinhos e o tivessem espalhado por uma pauta em forma de fusas e semi colcheias.

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Teatro Turim - O último dia dos meus quatro anos

No final do espetáculo de ontem, os aplausos e o desligar dos projetores souberam a fim. Era o último espetáculo do Teatro Turim. Vamos aguardar pelo futuro daquele espaço mas, por agora, é um espaço a menos. Mas com muitos mais que ficam fechados lá dentro. Lembro-me de todos os mais.
Quando, em 2013, eu e a Ana Campaniço tivemos a veleidade de nos lançar numa criação a dois, um projeto embrionário do que viria a ser a nossa AC.CA Produções, batemos à porta do Turim. E a porta abriu. Poucos meses depois, apresentávamos lá o "Camarim", essa primeira peça, esse primeiro esboço de um projeto teatral a longo prazo.


Depois disso, tivemos muito por onde crescer e muita coisa por conquistar. Público, desde logo; interesse pelos nossos espetáculos, também; capacidade de concretizar uma programação regular, tivemo-la.


O Teatro Turim foi, assim, o habitáculo disto tudo. De um projeto em construção, de vários projetos em experimentação; salas com pouca gente, no início; salas surpreendentemente cheias nos últimos dois anos. Crescemos muito naquele teatro.

Criámos a Oficina de Teatro e, com ela, juntámos um grupo de pessoas empenhadas, com imensa vontade de aprender e de fazer arte. Fizemos arte com essas pessoas, as mesmas que ontem encerraram o Turim, com um espetáculo delicioso.


Em quatro anos vivem-se muitas histórias para contar e guardam-se muitas memórias. Não tem interesse largá-las, vão ficar no interior de cada um de nós que as viveu. E os mais importantes e marcantes são as pessoas com quem partilhámos esse tempo. Os colegas e os alunos, certamente, mas esses seriam os mesmos noutro lugar qualquer. Na verdade, do Teatro Turim levamos duas pessoas na memória e no coração.
A Lurdes Silva, a mulher que nos abriu a porta e disse sim, podem entrar; aquela que sempre e sem exceção nos brindou e a todos os que entraram ali dentro com um profissionalismo à prova de fogo; aquela que, em certos momentos, foi apaziguadora de tensões e stress pré e pós criativo.
Já sobre o Henrique Moreira, tenho uma coisa a dizer. Todos os espetáculos que fizemos estavam piores antes de ele intervir. Em tudo o que nos criámos, o Henrique colocou a sua atenção e a sua capacidade de, com uma luz que fosse, transformar algo potencialmente interessante em alguma coisa bonita. Quanto ao resto, também partilhou connosco os traumas pré e pós criativos e para todos eles teve uma palavra e um abraço.


Parece-me este um relatório sentimental breve e pouco exagerado do que foram quatro anos a habitar no Teatro Turim. É triste, dá uma certa nostalgia ver algo assim acontecer mas não é o fim do mundo. Há um certo peso quando a cortina se fecha pela última vez e se sente que vão ficar muitas saudades mas tudo vai continuar noutro local, noutros locais. O que fica é apenas isto. Histórias, memórias e, no nosso caso, um período muito importante e muito intenso de um percurso artístico.


Por fim, deixo uma mensagem para os proprietários do Teatro Turim, uma mensagem de agradecimento. Se tudo o que atrás vivi e descrevi a eles se deve. Deveu-se a eles a existência de um lugar de experimentação, de criação, de teatro. Por todo o público que pode desfrutar de coisas boas e tão diversas, por todos os meus colegas que ali encontraram, como eu, oportunidade e acolhimento para trabalhar, para mostrar projetos, para fazer arte, o meu muito obrigado.
Sei bem dos encargos financeiros que manter um teatro a funcionar comporta, sei bem do escasso retorno desse investimento mas também sei bem da importância de ele existir. Quando vejo alguém interessado ou permissivo em que um teatro exista, em que profissionais do espetáculo tenham onde criar, em que o público tenha acesso à Cultura, não podia ficar senão inteiramente grato.
Não o devendo fazer, julgo falar por todos os que, de uma forma ou de outra, contactaram com o Teatro Turim. Ele foi importante para mais do que uma geração de artistas. Por isso, neste momento de interrupção, a minha última palavra vai para quem detém o Teatro Turim. Obrigado por ele ter estado cá até agora! Se ele voltar, será tão ou mais importante do que o que já foi.





sábado, 16 de dezembro de 2017

Uma lista de 2017: "Menina sem Estrela" de Nelson Rodrigues

Estamos em período de listas. São as listas dos melhores do ano. Os melhores filmes, as melhores séries, os mais vistos, os mais gostados, os mais gozados, os mais bem vestidos e os mais queridos, os mais cómicos e os mais dramáticos, os mais ricos e os outros, listas, listas, listas... Os melhores de 2017. Gosto de listas, ainda que as ache perfeitamente inúteis. Na lista de coisas inúteis incluo as listas. Mas, no final do ano, fazem-se listas. Também de livros. Os mais vendidos, os mais lidos (que é diferente de mais vendidos) e os melhores. Gosto de listas, acho-as inúteis, quero fazer uma lista!

De livros. Não vou selecionar os melhores. Li poucos o suficiente para não saber escolher os melhores e talvez não tenha lido nenhum dos melhores. Mas li alguns de que gostei. Nos próximos dias selecionarei algumas leituras que fiz em 2017 para falar delas e recordá-las. É uma lista o que vou fazer nos próximos dias.

Não seguindo qualquer ordem nesta lista que vou fazer - também não aguento listas ordenadas -, hoje menciono uma obra de caráter autobiográfica de um dos meus autores de eleição, Nelson Rodrigues. A Menina Sem Estrela reúne as memórias do dramaturgo brasileiro, numa escrita fluída, crua e apaixonante.
Nestas memórias estão a morte, a sexualidade, a violência, o sarcasmo, o êxito e a rejeição. Uma extensão das peças de Rodrigues ou a causa delas, não sei e não interessa porque tudo isso existe, tudo isso é forte, tudo isso trágico e as memórias não têm de ser belas, têm de ser memórias.

Edição Tinta da China - Novembro de 2016



"O grande ator nada tem de truculento nem berra. É inteligente demais, técnico demais; e tem uma lucidez crítica, que o exaure. O canastrão, não. Está em cena como um búfalo da ilha de Marujó. É capaz de tudo. Sobe pelas paredes, pendura-se no lustre e, se duvidarem, é capaz de comer o cenário. Por isso mesmo, chega mais depressa ao coração do povo, deslumbra e fanatiza a plateia"

domingo, 10 de dezembro de 2017

As Solidárias

Elas dão, elas baralham
Elas tiram, elas caralham
Preocupam-se com quem não tem
Voam alto por alguém
Multiplicam dez por cem
São umas tipas bestiais
São uns gajos tipo brutais
Fazem o que ninguém imagina
Mesmo trinta por uma linha

São profundamente…
Fogo!... São mesmo do caralhiço
Elas causam rebuliço
Eles dão tudo por isso

Mas, no fim, de formas várias
Vem-se a saber que as canalhas
De formas várias
As canalhas
Elas tiraram e abusaram
Foderam e refoderam
Só não fizeram o que não quiseram
De formas várias se soube
E por tantas coisas várias
E por serem más e várias
Putas, longe!
Mas estou farto de solidárias.

(Carlos Alves, 10/12/2017)

Fonte imagem: Revista VIP


sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Em Novembro, Sexo é Quando a Avó Quiser

"SEXO É QUANDO A AVÓ QUISER" estreia dia 16 de Novembro, no Teatro Turim, em Benfica.
Esta é a nossa nova produção, que conta com Ana Campaniço, Carlos Alves e Susana Rodrigues. Depois de Os Nossos Vizinhos Dormem Cá em Casa, apresentamos um novo espetáculo que terá a exploração absurda de certas atitudes humanas como pano de fundo.

Um jovem casal, empenhado na construção de uma vida em conjunto, é surpreendido, numa noite, pela chegada da avó dela. Despejada do prédio, alegadamente para que este seja convertido num hotel, a avó rapidamente toma conta da casa e da vida deste casal. É este o ponto de partida para uma comédia de situação, recheada de momentos hilariantes provocados pelo choque de personalidades e da invasão de privacidade do outro.



quarta-feira, 23 de agosto de 2017

"Panela de Pressão" é o novo programa de humor da RDS Rádio

No final de julho, quando iniciei a habitual pausa de Verão da rubrica "Dias em Crónica" na RDS Rádio, já sabia que ela não voltaria. Não o quis anunciar, ainda havia muito para planear, para pensar, discutir e decidir, mas a minha convicção era essa. A minha convicção era que, após quase quatro anos a fazer aquela rubrica na maior rádio das regiões de Lisboa e Setúbal, havia necessidade de refrescar. Até porque já não aguentava mais ouvir aquele genérico. O humor na rádio é um trabalho muito específico, em que o texto importa, a voz é essencial mas estamos numa zona em que os olhos não veem e o coração tem de sentir.

Foi então que, ainda em julho, apresentei a minha nova proposta à RDS. Vamos, em setembro, apresentar uma rubrica de cara lavada, passada no crivo de quatro anos de sucessos e erros, acrescentada com ideias que nunca chegaram ao microfone, alicerçada na certeza de que não farei humor controlado (porque está muita gente a ouvir... ai, ai), pois certamente ganharia mais em estar calado. Eles aceitaram e eu deitei mãos à obra.

Assim surge agora o "Panela de Pressão". Na rádio, nos mesmos horários da rubrica anterior, e depois em podcast, em setembro. A data será anunciada muito em breve.






quinta-feira, 27 de julho de 2017

Coisas de Mulheres


Depois da participação no Got Talent Portugal, a Ana Campaniço decidiu começar a preparar um monólogo completamente novo. "Coisas de Mulheres" foi o mote para a minha escrita de um texto humorístico que mergulhasse nessa imensidão de "coisas". O resultado é apresentado, em estreia nacional, em setembro, no Teatro Turim, em Lisboa.


SINOPSE
As histórias da condição feminina na aparente vulgaridade do quotidiano de todas as mulheres num espetáculo hilariante e único. Em cima de um palco são expostas todas as questões às quais nenhuma mulher é indiferente e das quais nenhum homem sai como inocente. As dietas, os filhos que existem ou não, as roupas, os casamentos, o sexo e muitos mais temas serão abordados de forma crítica e atípica. “Coisas de Mulheres” é um monólogo intensamente cómico na abordagem que faz ao universo feminino. Interpretado por Ana Campaniço, decerto levará a espectadora, e não menos o espectador, a rever-se nas situações relatadas, como quem ri ao espelho.


segunda-feira, 17 de julho de 2017

Sunset no Verão, Silly Season o Ano Inteiro

Estamos em plena época de caça ao sunset. O que é o sunset? É o por do sol. É uma coisa que já existe pelo menos desde que há sol mas agora até para isso é preciso um vestido novo e um copo de gin. Ninguém vai ver o por do sol de calções, t-shirt e chinelos. O por do sol tem de ser visto com roupa da Bershka, litros de água tónica com gelo e um pouco de bebida amargosa lá dentro, ao som de uma música que faça lembrar uma empresa de mudanças a carregar móveis para uma carrinha. Por isso, procurem na em blogues da especialidade quais os sunset perto de vós onde poderão ir hoje!

- Mas não posso ver o por do sol da varanda da minha casa? - pergunta o leitor.
Podes. E até é mais inteligente.

O verão é, além do mais, pródigo em lixo informativo, pelo que infografismos com os melhores sunset deste Verão também poderão ser consultados em jornais ditos de referência e outros.
De resto, valia mais que os jornalistas tirassem todos férias porque, durante estes meses, só se enterram. A verdade é que, cada vez mais, se enterram o ano todo. Mas, no Verão... Ninguém está com paciência para notícias importantes e então vai de lhes servir banalidades. Nesta época, toda a imprensa vira revista de cabeleireiro.
Eu devo contar que uma vez, já há muitos anos – quer dizer, muitos também não tenho, mas já há alguns anos –, pouco tempo depois de acabar um curso de jornalismo, passou-me a ideia de ir pedir emprego a um grupo desses que detêm uma panóplia de revistas ditas cor de rosa. Uma empresa que começa por I e acaba em A e rima com sala ou pala. Enfim, eu não devia estar bem nessa altura para achar que talvez pudesse fazer sentido eu escrever sobre a congestão nasal de Rita Pereira ou banalidades sobre outras pessoas sem qualquer relevância social, muito menos cultural. Na altura, eles perceberam mais depressa do que eu que isso não fazia sentido e não me deram emprego. Claro que arranjei outro logo a seguir e até hoje nunca fui responsável por frases como: “veja os melhores decotes da festa da TVI”, “José Carlos Pereira em clima de romance com (preencher espaço branco, porque eu não sei os nomes das pessoas) ou “David Carreira na nova novela da TVI”.

Bom, mas esta última ninguém devia ser obrigado a escrever.


terça-feira, 11 de julho de 2017

Lá Não É Como Cá

O Verão é a melhor época para ficarmos a conhecer como funcionam os outros países. Como funciona a França, a Suíça, o sistema de Saúde do Luxemburgo e a Segurança Social da Alemanha; quanto é que um trabalhador desconta por lá? E que direitos tem? E tudo, e tudo?...

Porque, atenção, lá não é como cá! – Esta é uma frase com a qual todo o rol de explicações vai começar

Porque, lá, nós vamos ao médico e ainda é o médico que nos paga por termos ido;

lá não é como cá, porque, lá, compramos um carro e o carro vem por aí fora e tem travões e embraiagem já incorporados

sim, mas cá também…

mas lá não é como cá, porque, lá, os travões vão a fundo e travam…

traz aí duas cervejas para este rapaz! quanto custam? Dois euros?! Traz quatro cervejas para este rapaz porque lá não é como cá, com dois euros nem uma cerveja bebes!...

Agora, só volto cá na reforma, porque lá não é como cá, eu desconto e eles dão-me a retraite assim sem pedir… levam-ma a casa e ainda pedem desculpa!

Agora, só volto cá para o ano, no mês de agosto, antes da retraite, porque… lá não é como cá, não fico no café até às dez da noite, nem passo as tardes no shopping ao domingo, nem vou ver o Benfica ao estádio, nem o Tony Carreira ao Olympia porque…

lá não é como cá, se fizesse isso tudo, estava lixado, vinha de lá endividado, sem retraite, sem carro nem travões nem dois euros para pagar duas cervejas, porque…

lá não é como cá

cá estava-se bem melhor mas agora não dá jeito

deixem-me gozar o prato durante duas semanas porque o resto do ano é só marmita


sábado, 1 de julho de 2017

Quatro dias a morrer duas vezes

No Teatro Turim, em Lisboa, está a decorrer mais uma apresentação da Oficina de Teatro. Sob a direção dos atores Carlos Alves e Ana Campaniço, os alunos apresentam "Nem Que Morra Duas Vezes", um "espetáculo carregado de marcas expressionistas, transportadas para um registo de comédia negra, com a música e a dança a marcar o ritmo de um cabaret a descobrir e onde imergir".

Esta é a terceira criação saída da Oficina de Teatro do Turim, fruto do trabalho e aprendizagem desenvolvidos ao longo de períodos de três meses.

De acordo com a coordenação do workshop, este vai entrar agora em período de férias, retomando no mês de setembro. Até lá, estão abertas inscrições para que novas pessoas possam entrar.